sábado, 2 de novembro de 2013

BEIJA-FLOR


Beija-flor suave em pétala resiste a sorver doce sabor, ardor 
A lascívia
 saliva tenta, atormenta, resiste, insiste
Beija-flor em arco simétrico, deslisa, alisa, aspira, conspira 
Adorável geografia plana, plena, desponta em gêmeos acordes, deleite, enfeite
 
Esta vaga planície aveludada onde se esbalda o leão, rufião, sedução
 
Beija-flor em vértice, sem aresta a floresta aspira, inspira, transpira, conspira
 
Gostosa geometria perfeita, pilares a se afastar, constatar 

A maçã que se oferece a quem melhor apetece, quem não merece.
Arrefece em néctar a esbaldar, acredite, manjar
 de Afrodite.
Beija-flor em tempo infinito, se desprendendo da flor, sabor, ardor
.
Se encontra a 
ganhar o espaço, sem limites, arrebites.
Recanto úmido, aconchego orvalhado, desfolhado.
Beija-flor profano, insano, soberano
Soprando ao vento o canto da ave ferida, querida, dor maldita
Seja a aurora bem vinda, se finda a noite... boa noite!




segunda-feira, 28 de outubro de 2013

QUEM É JORGE SILVA?

Nasci em uma ensolarada manhã da planície ibérica, nos idos do ano de 1369, filho de um nômade árabe e uma espanhola espevitada. Fui batizado como João Hipólito e aprendi minhas primeiras letras com frei Agostinho, o qual me passou as primeiras noções da filosofia cristã.

Mais tarde, por volta do ano de 1470, tornei-me tão errante quanto o meu pai e fui parar em Florença, levado pela minha curiosidade insaciável e um formigueiro preso no fundo das calças. Lá conheci Leonardo, um sujeito da cidade de Vinci, com quem dividi meus conhecimentos de matemático, anatomista, arquiteto, poeta, pintor e escultor.

Inquieto e querendo fugir dos assédios de uma senhora burguesa, a quem eu apelidara docemente de Monalisa, uma vez mais pus o pé na estrada. Deixei, porém, com o jovem Leonardo alguns rabiscos de minhas invenções e voltei para a Espanha, já no ano de 1490.

Foi numa taberna, ao som de um flamenco e regado a muito vinho que contei a um tal Colombo as minhas teorias sobre a circunferência da Terra e a possibilidade de se alcançar as Índias em uma rota marítima contrária à praticada então. Um tanto quanto “burrinho”, o infeliz não conseguiu entender a magnitude das minhas conjecturas, o máximo que aceitou foi uma meia circunferência. Meses mais tarde fiquei sabendo do próprio que ele usou minhas idéias para convencer os Reis Católicos a lhe entregar a direção de uma frota de navios. Despedi-me dele, recusando um convite seu para desbravar novos horizontes.

Precisando de dinheiro, aceitei fazer parte da escolta de um bispo romano, foi onde conheci um frei alemão, cujo nome era Martin Luther ou Luder (sei lá como se pronunciava), mas que eu sempre chamava por Lutero, que era mais latino. Interessado pelas minhas idéias pouco ortodoxas quanto à venda de indulgências pela igreja romana, travamos longas horas de conversa. Com ele fui à Alemanha, onde ajudei na elaboração das 95 Teses.

Enquanto Lutero panfletava pela Alemanha eu era obrigado a fugir (com as calças na mão), pois fui flagrado por um nobre ranzinza enquanto ensinava sua jovem esposa a tricotar.

Fui procurar abrigo na cidade luz. Paris era um poço de aventuras nos idos de 1778. No meio do caos econômico e do descontentamento geral, tornei-me mosqueteiro do rei, sob a identidade falsa de George Vincent. Alguns tiros de mosquetes e outras tantas espetadas de florete e me tornei capitão da guarda da rainha Maria Antonieta. Cheio de graça aos olhos da rainha, ao que me apetece tive uma participação subjetiva no nascimento do primogênito do rei, no ano de 1781.

Desconfiado da excessiva confiança que sua adorada esposa depositava em mim, fui convidado pelo rei para me tornar espião e me infiltrar no meio dos burgueses, pois se acreditava tramar uma revolução. Ainda mais cheio de graça aos olhos de uma burguesinha saltitante, mudei de lado e denunciei todas as facilidades reais para os conspiradores.

Em 1789 a coisa ficou feia na França e, com medo de que a guilhotina também virasse para o meu lado, caí novamente na estrada e voltei à Alemanha, certo de que já haviam esquecido da minha cara, devido ao caso das teses protestantes.

Trabalhei por meses na manutenção de moinhos e, nos momentos em que uma pastorinha me deixava respirar, eu bebia vinho numa taberna, discutindo sociologia com Karl Marx. Corria o ano de 1840 e eu, indignado com a burguesia ociosa e minha condição de industriário, discursava em causa própria defendendo a igualdade entre os homens. Inquirido por Karl, sobre o que eu achava da religião, eu , já meio rouco e entupido de cerveja, desabafei: “A religião é o suspiro do ser oprimido, carente, que busca no espiritual um alívio para a realidade dura!” Extasiado, ele aplaudiu sorrindo e completou: "É, eu sei, a religião é o ópio do povo!"

Na virada do século fui garimpar ouro nas minas de carvão da Rússia. Lá, conheci um jovem seminarista de nome Vladimir, a quem apelidei de Lenin, devido ao sobrenome que nunca consegui pronunciar corretamente. Ele se interessou muito pelas idéias que eu e Karl Marx desenvolvemos sobre o capitalismo e fez o que fez lá, na Rússia. De lá também fugi com as calças na mão, antes que a revolução me taxasse de contra-revolucionário. Afinal, Lenin não era assim, tão confiável.

Fui, então, conhecer finalmente o novo mundo. De olho no sonho americano e nos dotes de uma deliciosa viuvinha, embarquei como clandestino no Titanic e só não naufraguei junto porque o bom Deus tinha outros planos para mim. Fui então trabalhar na bolsa de valores de Nova Iorque, onde fiquei especulando até 1929. Especulei tanto que a coisa "fedeu".

Depois de muitas peripécias pelo mundo afora, em 1963, aportei em berço nem tão esplêndido, nas terras tupiniquins. De onde não saí até hoje, correndo atrás de aventuras e fugindo do perigo.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

CANTIGA



Passarinho que estás cantando nos galhos da madrugada,
Por muito que tenhas visto, te juro que não viste nada.
Não viste as ondas do mar que vinham se desmancharem na areia;
Quase vida, quase morte, quase corpo de sereia...
E as nuvens se deslisando com marcha e atitude de pelotão
Com a mesma atitude e marcha, tanto chegam como se vão.
Não viste as letras, que apostam forma idéias com o vento...
E as mãos da noite quebrando os talos do pensamento.
Passarinho tolo de sonoro canto, com olhinhos arregalados...
Bem-te-vi, que nunca viste como os meus olhos fechados...

NOTURNO


Minha alma é como o rochedo onde o abutre pia sem medo zombando do vendaval
Coberto de escuros matizes e lavrado em cicatrizes dos raios no temporal

Nem um resto de esperança e nem um gesto de bonança na fronte sinto passar
Os invernos me despiram e as vaidades que haviam nunca mais hão de voltar

Quero morrer! Este mundo, com seu sarcasmo profundo, manchou-me de lodo e fel
Meu talento consumiu-se e minha esperança esvaiu-se, dos martírios ao tropel

Quero morrer! Não é crime. Este fardo que me oprime, dos ombros lançá-lo ao chão
Da lama desprender-me rindo e as asas brancas se abrindo, perder-me pela amplidão