sábado, 30 de abril de 2011

CANÇÃO

Pus o meu sonho num navio e o navio em cima do mar,
depois abri o mar com as mãos, para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos colore as areias desertas

O vento vem vindo de longe, a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo meu sonho dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso, para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito: praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras e as minhas duas mãos quebradas

CECÍLIA MEIRELES

DESENREDO


Por toda terra que passo me espanta tudo que vejo
A morte tece seu o fio de vida feita ao avesso
O olhar que prende anda solto; o olhar que solta anda preso
Mas quando eu chego eu me enredo nas tramas do teu desejo

O mundo todo marcado a ferro, fogo e desprezo
A vida é o fio do tempo, a morte é o fim do novelo
O olhar que assusta anda morto; o olhar que avisa anda aceso
Mas quando eu chego eu me perco nas tranças do teu desejo

Ê Minas, ê Minas, é hora de partir, eu vou
Vou-me embora pra bem longe

A cera da vela queimando, o homem fazendo seu preço
A morte que a vida anda armando, a vida que a morte anda tendo
O olhar mais fraco anda afoito; o olhar mais forte, indefeso
Mas quando eu chego eu me enrosco nas cordas do teu cabelo.

Ê Minas, ê Minas, é hora de partir, eu vou
Vou-me embora pra bem longe...

Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro